Ciente do sofrimento e degradação causado pelo uso insustentável dos bens materiais da Terra, nós estamos determinados a encontrar meios de utilizar os recursos com consciência plena e uma visão clara dos efeitos em longo prazo desta utilização sobre as gerações futuras e nós mesmos. Sabendo que o sofrimento coletivo provenientes da mudança climática global, desmatamento, escassez de água e poluição do ar, do solo e das águas, surge de ações diárias dos seres humanos, comprometemo-nos a transformar nosso modo de vida para fazer surgir paz e harmonia em nossa família, nossa comunidade local e ecossistemas, e no mundo.
Iniciativa ecológica da comunidade em Deer Park.
Em nossos próprios mosteiros e centros de prática na Europa e América do Norte, estivemos adaptando várias iniciativas ecológicas para proteger o clima e ajudar as pessoas a se tornarem mais conscientes do que elas podem fazer para minimizar os impactos delas mesmas sobre a Terra. Em dezembro de 2007, o Mosteiro Deer Park, Escondido, Califórnia, tornou-se 100% solar. Toda nossa eletricidade é agora criada pela pura energia do sol.5 A nossa inovadora cerimônia foi muito comovente. Mais de mil praticantes participaram e muitos de nós tínhamos lágrimas de alegria nos olhos. Ao fazermos a conversão para energia solar estamos tornando mais leves as nossas pegadas sobre a Terra, assim podemos realmente nascer como responsáveis e amáveis filhos da Terra.
Nossa Sanga aspira viver em harmonia com a região, com toda a vegetação e animais, e com todos os nossos irmãos e irmãs. Quando estamos em harmonia um com o outro, também estamos em harmonia com a região. Vemos o nosso relacionamento íntimo com cada pessoa e cada espécie. A felicidade e sofrimento de todos os humanos e de todas as outras espécies são a nossa própria felicidade e sofrimento. Nós inter-existimos. Enquanto praticantes, percebemos que fazemos parte e não estamos separados de toda a civilização humana. Enquanto seres humanos, nós compreendemos que somos filhos da Terra e não estamos separados do solo, das florestas, rios e céu. Partilhamos o mesmo destino.
Muito prejuízo foi feito à Terra por ignorância, ganância e arrogância. Enquanto filhos destas terras, nós estamos determinados a recomeçar de uma nova maneira – fazendo todos os esforços, grandes e pequenos, para efetuar coletivamente uma mudança real em nossa situação ecológica global. Nossa comunidade se comprometeu a não exaurir a energia e recursos da região com nossas ações descuidadas, mas sim contribuir pela regeneração desta linda região, trazendo frescor, paz e felicidade para todos que vêm até aqui. Começamos a usar menos carros, e, ao invés, usar carros elétricos e carros que funcionam com óleo vegetal reciclável, que pode reduzir pela metade as emissões de gases de dióxido de carbono (CO2) liberados. Nós fazemos compras para nossa comunidade apenas uma vez por semana. Cultivamos plantas nativas para reduzir o uso de água, nós fazemos adubo e reciclamos o lixo, e substituímos todas as lâmpadas elétricas pelas que consomem menos energia.
Também estamos praticando “O dia sem carro” uma vez por semana para reduzir nosso consumo de gasolina. Uma vez por semana não é suficiente, mas já é alguma coisa – algo que demonstra nosso despertar, nossa determinação de agir, de praticar o consumo consciente. Adotar a prática de “dias sem carro” tem nos dado muita alegria porque sabemos que estamos fazendo algo. Nós não queremos ser vítimas do desespero. A nossa mensagem é antes de tudo não verbal; nossa mensagem é a nossa própria ação.
Na medida em que dirigimos menos e nos ajudamos, ajudamos ao planeta, e ao Buda interno de cada um de nós a respirar mais facilmente; nós vemos que mesmo uma escolha muito pequena como não usar o carro na área do mosteiro pode fazer acontecer coisas benéficas. Quando você vem para Deer Park e estaciona o seu carro lá embaixo no estacionamento principal e usas os seus pés para ir até a parte superior do terreno do mosteiro, você está se dando uma oportunidade de experimentar muita alegria. Você tem uma chance de praticar meditação caminhando; do estacionamento até o salão de meditação, você desfruta cada passo.
Você começa a inspirar e a expirar conscientemente e, com cada passo, entra no Reino de Deus. E este é um reino verdadeiro, uma Terra Pura real. Ao não usar o seu carro você mantém o ar limpo, tem mais prazer e você está em contato com as árvores, as flores, as pedras, os coelhos. O fato de estar em contato com as maravilhas da vida: a luz do sol, a chuva e as flores pode lhe trazer muita alegria.
Certa manhã havia centenas de nós andando vagarosamente, calmamente, pacificamente, apreciando um ao outro, desfrutando cada passo. Nós não conversávamos, não estávamos ouvindo televisão, rádio, ou mesmo uma palestra de Darma. Nós apenas nos deleitávamos em caminhar juntos, em irmandade, sem pensar em coisa alguma, sem falar, apreciando nossa inspiração e expiração e nossos passos, entrando em contato com o nosso pai, nossa mãe, sorrindo para eles. Este é o Reino de Deus. Porque nos privamos deste tipo de maravilha? Todo momento como este é saudável, transformador e nutritivo. Temos a capacidade de fazer isto individualmente e também coletivamente enquanto comunidade.
No aniversário de dois mil, quinhentos e cinqüenta anos de Buda, eu propus a idéia de “Dias sem carros” – dias em que podemos todos celebrar juntos, educar as pessoas sobre o aquecimento global, e produzir os efeito de um despertar coletivo.6 Todos nós podemos convocar nossas respectivas comunidades a praticarem dias sem carro – senão toda semana, todo mês – para que possamos chamar a atenção das pessoas para a perigosa situação que o nosso planeta se encontra.7 Um Dia sem carro é o seu presente para o planeta. Você poderia ir de bicicleta ou de ônibus ou trabalhar em casa. Isto não deve ser apenas uma convocação à ação, mas a própria ação. Vamos fazer isto agora, junto, acordar as pessoas antes que seja tarde demais. Temos que encarnar a mensagem que queremos enviar ao mundo. Estamos tão ocupados em nosso cotidiano que precisamos de Buda toda semana, todo dia, nos lembrando de viver de um modo que possibilite um futuro para os nossos filhos e netos. Deixar para trás um planeta profundamente ferido não seria muito amável aos nossos filhos.
Cada pessoa, cada família, cada comunidade e país podem fazer algo para ajudar a parar o avanço do aquecimento global. Professores de escolas podem conversar com seus alunos – particularmente filhos e pessoas jovens são capazes de compreender dificuldade e sofrimento, e elas estão totalmente conscientes do quão em perigo a Terra está. As crianças têm boas idéias e o desejo de compartilhá-las. Às vezes os membros mais jovens de uma família ou de uma comunidade têm maneiras de olhar para uma situação que são mais repletas de discernimento do que o ponto de vista dos mais idosos. Quando as pessoas jovens são capazes de expressar suas idéias, elas sentem que estão contribuindo para a comunidade. Por conseguinte, elas não se sentem arrastadas pela correnteza ou empurradas para as margens da vida. É importante que pais e professores ouçam profundamente as gerações jovens e as estimulem a falar em público.
As crianças são hábeis na prática da consciência plena e lembram os outros a fazerem o mesmo. Eu conheço muitos jovens que sabem praticar e transformar suas vidas, e são capazes de ajudar os seus pais e outras pessoas a se transformarem. Estas crianças nos dão muita fé no futuro. Não estamos num beco sem saída. Temos um roteiro de libertação. Precisamos apenas segurar a mão um do outro e caminhar juntos neste caminho. Nossos ancestrais também andaram neste caminho. Este caminho é o caminho da irmandade e é mais precioso do que qualquer ideologia ou religião.
Muitos membros da nossa família global já estão andando juntos neste caminho. A Dinamarca foi capaz de usar energia do vento para obter vinte por cento de sua eletricidade. Na Islândia, noventa e três por cento dos lares já são aquecidos geotermicamente. O povo da Coréia do Sul replantou florestas. A Suécia anunciou o objetivo de ter uma economia sem óleo até 2020. A Austrália comprometeu quinhentos milhões de dólares – mais do que qualquer outro governo – para combater a mudança climática. A União Européia fez da estabilização climática prioridade máxima. Esses são fatos maravilhosos.
Outra coisa que podemos fazer é escrever para nossos representantes políticos e dizer a eles o que queremos. Quando as pessoas têm uma visão clara e toma uma decisão o governo não tem escolha senão seguir. Permita que os seus representantes eleitos saibam que você quer políticas financiando o desenvolvimento de puras fontes de energias renováveis e o fim da destruição das florestas. Você tem que apoiar os parlamentares e o seu governo provendo-os com o seu discernimento e idéias. Os insights individuais ajudam a fazer surgir insights coletivos, e com insights coletivos haverá ação de grupo. Temos que nos tornar conselheiros e auxiliares do governo. Temos que dizer a eles que a verba para a defesa, no mundo todo, está fora de sincronização com tudo o mais. Um sexto desta verba poderia fazer uma mudança que salvaria o planeta. O Conselho de Segurança das Nações Unidas deveriam trabalhar nisto. É urgente. Peça às nações do mundo para usar um sexto da verba militar para salvar nossa Terra. Isto é sensato e isto é possível.
Atos como este de organizar Dias sem carro podem nos libertar das preocupações cotidianas para que sejamos capazes de ver que existe violência invadindo o mundo. Se você realmente quer continuar a carreira de Buda, você tem que ajudar este despertar coletivo. É importante ter o apoio de sua família ou comunidade. Quando vivemos em uma comunidade onde todos praticam o consumo consciente, é fácil para nós praticar o consumo consciente. Faremos isto enquanto Sanga, com irmandade, e deste modo nenhuma pessoa tem que se preocupar.
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5 O sistema fotoelétrico de 66 quilowatts em Deer Park gera toda a eletricidade que o mosteiro necessita e impede a emissão de 120 toneladas de carbono na atmosfera por ano.
6 Em discurso à Organização Cultural, Científica e Educacional das Nações Unidas (UNESCO) no dia 07 de outubro de 2006, Thich Nhat Hanh sugeriu passos concretos para por fim ao aquecimento global e propôs a recomendação de “Dias sem carro no globo”.
7 O dia 22 de setembro é o “Dia mundial sem carro”. Visite www.car-free-days.org para saber mais sobre a Campanha dos Dias sem carro e para assumir o seu compromisso.
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